“- Na arte de espreitar – continuou Don Juan – há uma técnica que os feiticeiros usam muito: loucura controlada. Segundo eles, a loucura controlada é a única maneira que têm de lidar consigo mesmos, em seu estado de consciência e percepção expandidas, e com todos e tudo no mundo dos afazeres diários.
Don Juan explicou a loucura controlada como a arte do engano controlado ou a arte de fingir estar profundamente imerso na ação – fingindo tão bem que ninguém pudesse distingui-lo da coisa real. A loucura controlada não é um engano direto, mas um modo sofisticado, artístico, de estar separado de tudo permanecendo ao mesmo tempo uma parte de tudo.
– A loucura controlada é uma arte – continuou Don Juan. – Uma arte que causa muitas preocupações, e muito difícil para se aprender. Muitos feiticeiros não suportam isso, não porque haja alguma coisa inerentemente errada com a arte, mas porque é preciso muita energia para exercê-la.
Don Juan admitiu que a praticava conscienciosamente, embora não gostasse particularmente de fazê-lo, talvez porque seu benfeitor fosse tão adepto a ela. Ou talvez fosse porque sua personalidade – que ele disse ser basicamente tortuosa e mesquinha – simplesmente não tinha agilidade necessária para praticar a loucura controlada.
Olhei para ele com surpresa. Parou de falar e fixou-me com seus olhos maliciosos.
– Na época em que chegamos à feitiçaria, nossa personalidade já está formada – disse, e encolheu os ombros em sinal de resignação – e tudo que podemos fazer é praticar a loucura controlada e rir de nós mesmos.
Senti uma onda de empatia e assegurei-lhe que para mim ele não era de modo algum mesquinho ou tortuoso.
– Mas esta é minha personalidade básica – insistiu. E eu retruquei que não era.”
(O Poder do Silêncio, Carlos Castañeda)