“A liberdade de um guerreiro reside em compreender que é antes de tudo um ponto de aglutinação, e compreender as implicações disto. A partir do momento que se entrega à uma descrição, nada pode fazer pra se opor às forças daquele alinhamento, às forças do mundo. Se torna uma peça no tabuleiro da própria mente.”
P: A percepção é um fim em si mesma? A reflexão na descrição do que acontece nos torna fracos?
R: “Essas são perguntas com poder. Podemos nos ver/refletir como forte ou fraco.
No primeiro caso nossa reflexão tem o sentimento de ganhar mais autonomia naquela descrição de mundo, naquele alinhamento. Se torna capaz de sustentá-lo e mantê-lo.
No segundo caso se sente uma folha ao vento, a mercê das forças daquela descrição de mundo. Mas em ambos os casos, aquilo que está sendo refletido segue sendo apenas e somente uma descrição. Só uma história sendo contada e experienciada. Se entregar a ela é perder o poder de recordar e compreender que está incondicionalmente além de descrições. Perder a sua paz inabalável. Esse poder é a nossa liberdade enquanto pontos de encaixe.”
“Tudo que se percebe agora, inclusive o próprio corpo e personalidade, são parte de uma descrição. Certo? Quando se sonha, tanto o mundo em volta quanto a pessoa que se é mudam. Podemos nos sonhar fracos ou fortes, se dizemos e repetimos pra nós mesmos que somos uma das duas coisas, até acreditar com cada célula do seu corpo que isso seja verdade. Aí aquilo é vivido como verdade. Podemos nos sonhar em determinado sonho como mais jovens ou mais velhos. Até como outra pessoa. Cada um desses sonhos é uma descrição, uma história sendo contada. Nosso corpo-mente é parte dessa história particular, nossa reflexão dentro dela. A reflexão muda conforme a história. Quando acreditamos e entramos na história, qualquer que seja, nos parecemos nos tornar a nossa reflexão, sentimos nos tornar parte da história. Quanto mais se acredita numa descrição, mais real ela se torna, e mais presos ficamos dentro dela. Mas se podemos nos ver em diferentes situações, diferentes estágios, e até diferentes formas, quem ou o que somos nós, de verdade? Há algo de permanente aqui, capaz de testemunhar essas mudanças. O que é isso que testemunha todas essas mudanças – sonhar, acordar, envelhecer, estar aqui, estar em outro país, estar sob efeito de uma planta de poder, estar sóbrio – e que no entanto não muda com nenhuma experiência? O que é isso que não está limitado à uma forma, ou uma situação, ou momento específicos e que no entanto é mais íntimo até do que a ideia de si mesmo? Isso é diferente de você?
O que perde poder ao nos identificarmos não é a nossa pessoa. É o ponto de aglutinação, que se esquece constantemente de si mesmo dentro das histórias vividas.”
(Jeremy Christopher)