“— Do ponto de vista do homem comum — disse Don Juan — a bruxaria é bobagem ou um mistério agourento além de seu alcance. Ele está certo, não porque este seja um fato absoluto, mas porque falta ao homem comum a energia para lidar com a bruxaria. — Parou por um momento antes de continuar: — Os seres humanos nascem com uma quantidade finita de energia — continuou —, uma energia que é sistematicamente empregada, desde o momento do nascimento, de modo que possa ser usada da forma mais vantajosa pela modalidade do tempo.
— O que quer dizer por modalidade do tempo? — perguntei.
— A modalidade do tempo é o feixe (conjunto) preciso de campos de energia sendo percebidos. Acredito que a percepção do homem mudou através das eras. O próprio tempo decide a modalidade; o tempo decide quais feixes precisos de campos de energia, dentre um número incalculável, devem ser usados. E manipular a modalidade do tempo… esses poucos e selecionados campos de energia… toma toda a nossa energia disponível, não nos deixando nada que nos ajude a usar qualquer dos outros campos de energia.
— Isto é o que quero dizer quando afirmo que o homem comum não tem a energia necessária para lidar com a bruxaria. Se usar apenas a energia que tem, não pode perceber os mundos que os brujos percebem. Para fazê-lo, os brujos precisam usar um grupo de campos de energia não usado normalmente. Claro que, se um ser humano comum perceber esses mundos e compreender a percepção dos brujos, deve se utilizar do mesmo feixe que eles usaram. E isto simplesmente não é possível, porque toda a sua energia já está desdobrada. — Fez uma pausa, como se procurando pelas palavras apropriadas para demonstrar seu ponto de vista.
— Pense dessa maneira. Não é que, à medida que o tempo passa, você esteja aprendendo bruxaria; antes, o que está aprendendo é a economizar energia. E essa energia irá capacitá-lo a manipular alguns dos campos de energia que lhe são agora inacessíveis. E isto é bruxaria: a habilidade de usar campos de energia que não são empregados para perceber o mundo normal que conhecemos. Bruxaria é um estado de consciência. Bruxaria é a capacidade de perceber algo que a percepção comum não consegue.
Tudo pelo que fiz você passar, cada uma das coisas que lhe mostrei era apenas um instrumento para convencê-lo de que há mais coisas do que o olho pode perceber. Não necessitamos de ninguém para nos ensinar bruxaria, porque de fato não há nada a aprender. O que necessitamos é de um professor para nos convencer de que há poder incalculável ao alcance de nossos dedos. Que paradoxo estranho! Cada guerreiro na trilha do conhecimento pensa, num momento ou outro, que está aprendendo bruxaria, mas tudo o que está fazendo é permitir a si mesmo ser convencido do poder oculto em seu ser, e que pode alcançá-lo.
— É isto que está fazendo, Don Juan, convencendo-me?
— Isso mesmo. Estou tentando convencê-lo de que pode alcançar esse poder. Passei pela mesma coisa. E era tão difícil de ser convencido quanto você.
— Uma vez que o alcançamos, o que fazemos exatamente com ele, Don Juan?
— Nada. Uma vez que o alcançamos, este irá, por si mesmo, fazer uso de campos de energia que estão disponíveis para nós, embora inacessíveis. E isto, como eu disse, é bruxaria. Começamos então a ver, isto é, perceber, algo mais; não como imaginação, mas como real e concreto. E então começamos a conhecer sem a necessidade de usar palavras. E o que cada um de nós faz com esta percepção aumentada, com aquele conhecimento silencioso, depende de nosso próprio temperamento.”
(O Poder do Silêncio, Carlos Castañeda)